Eleições 2024: Polarização entre Lula e Bolsonaro deve se concentrar nas grandes capitais

Folha do Araripe

Folha do Araripe

As eleições municipais deste ano têm ganhado contornos nacionais nas últimas semanas, após as operações da Polícia Federal (PF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados, ao mesmo tempo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensifica viagens pelas principais capitais do Nordeste e do Sudeste. Apesar da polarização nacional crescente, ela deve disputar com fatores locais a atenção dos eleitores − e o efeito do contágio deve variar em cada pelito.

Em sete dias, Lula visitou os três maiores estados do país, que são liderados por aliados de Bolsonaro, e se encontrou com os respectivos governadores – em São Paulo e em Belo Horizonte, ele inclusive trocou afagos com Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Romeu Zema (Novo), dois nomes cotados para enfrentá-lo em uma eventual tentativa de reeleição em 2026. Semanas antes, o presidente iniciou seu “giro pelo Brasil” visitando as três principais capitais do Nordeste: Salvador, Recife e Fortaleza.

Outras influências nacionais também estão se movendo nas disputas locais, como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em Belo Horizonte – onde Lula esteve na quinta-feira (8) e se encontrou não só com Zema e o senador, mas também com o prefeito (e candidato à reeleição) Fuad Noman (PSD), apesar de o PT ter um pré-candidato melhor posicionado nas pesquisas. Já o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) vai apoiar a “terceira via” na capital paulista e tem se movimentado para ampliar a influência do partido, como a filiação de Cid Gomes e 40 prefeitos no Ceará. Ele afirmou recentemente que “eleição municipal é local” e que o candidato ter apoio político “ajuda”, “mas não é o fator decisivo”.

O analista político Carlos Eduardo Borenstein, da consultoria Arko Advice, diz que o componente nacional está ganhando importância nas eleições de outubro, mas destaca também a importância dos elementos locais nas disputas. Ele diz que, de um lado, o PT está preocupado em melhorar seu péssimo desempenho nas eleições de 2016 e 2020 – quando não elegeu nenhum prefeito nas 26 capitais, pela primeira vez desde a redemocratização. Do outro, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto (preso por porte ilegal de arma na operação de ontem da PF), tem a “previsão otimista demais” de chegar a mil prefeitos, usando Bolsonaro como cabo eleitoral – estratégia que será testada pelo avanço recente de investigações contra ele. “Mas isso não vai eliminar o debate municipal, porque no fim é uma eleição para prefeito”.

Veja abaixo um panorama da disputa em algumas das principais capitais do país:

Sudeste

São Paulo
Em São Paulo, o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), conta com apoio de Tarcísio, mas ainda busca o de Bolsonaro. Para isso, ofereceu a vaga de vice em sua chapa, e o ex-presidente indicou o nome de Ricardo de Mello Araújo, ex-comandante da Rota e presidente da Ceagesp em seu governo. Mas Bolsonaro não escondeu que sua vontade “de coração” era apoiar o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), agora fora da disputa. Para analistas, Nunes tem o desafio de se aproximar do bolsonarismo, para conquistar votos do eleitorado de direita, mas manter distância suficiente para evitar o contágio da rejeição a Bolsonaro na capital paulista.

O maior concorrente de Nunes é o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), que ficou em segundo lugar na eleição de 2020, quando o atual prefeito se elegeu como vice de Bruno Covas (PSDB), vitimado por um câncer aos 41 anos. Outros dois deputados federais “correm por fora”: Tabata Amaral (PSB), que é apoiada por Alckmin e recentemente foi elogiada por Lula; e Kim Kataguiri (União Brasil), que ainda tenta convencer seu partido a apoiá-lo, contra a vontade do influente Milton Leite.

A disputa é a mais nacional de todas: Lula a todo momento cola a figura de Bolsonaro em Nunes. Em entrevista a uma rádio de Salvador no mês passado, disse que “na capital de São Paulo, é uma coisa muito especial, porque é uma confrontação direta entre o ex-presidente e o atual presidente. Entre eu e a figura”. O presidente também conseguiu um reforço de peso para a candidatura de Boulos ao convencer a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) a deixar o cargo de secretária de Relações Internacionais da gestão Nunes e voltar ao Partido dos Trabalhadores, para ser candidata a vice na chapa.

Leia também:
Movimento de Marta expõe digitais de Lula e afeta estratégias de Boulos e Nunes

O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) durante o primeiro encontro depois de a ex-prefeita Marta Suplicy anunciar que será candidata a vice na chapa do pré-candidato à prefeitura da capital (foto: JLConceição)

Rio de Janeiro
No Rio, o prefeito Eduardo Paes (MDB) é favorito à reeleição. Mas a cidade é o berço do bolsonarismo, e o candidato do ex-presidente (até o momento) é o deputado federal Alexandre Ramagem (PL), ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que foi alvo de uma operação da Polícia Federal em janeiro. Para Borenstein, o fiel da balança vai ser a evolução das investigações sobre a existência de uma suposta “Abin paralela” da gestão Bolsonaro.

O analista político destaca o peso simbólico da cidade para o ex-presidente (e o bolsonarismo) e lembra a dificuldade histórica enfrentada pelo PT, que pode indicar o vice de Paes e herdar a prefeitura em 2026, caso ele decida concorrer para governador. “O PT teria o prefeito da cidade no reduto do bolsonarismo”, aponta.

A disputa envolve também o governador Cláudio Castro (PL), que se reelegeu com facilidade em 2022, com o apoio do ex-presidente, e é apontado como um possível candidato ao Senado em 2026. O bolsonarista passa por um desgaste político devido às chuvas no estado e às investigações sobre o seu irmão e pode ter dificuldade em fazer o seu sucessor, em uma eventual disputa contra Paes daqui a dois anos. Mesmo assim, também recebeu afagos de Lula – no mesmo evento em que o presidente atacou Bolsonaro e o chamou de “maluco” e “aloprado”.

Belo Horizonte
Na capital mineira, a eleição será crucial para o PSD e para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que pode disputar o governo de Minas Gerais em 2026 (quando vencerá o seu mandato parlamentar). Pacheco é do mesmo partido do atual prefeito, Fuad Noman (PSD), que registrou apenas 5,5% das intenções de voto na pesquisa Atlas Intel divulgada em 31 de dezembro. O líder é o deputado estadual Bruno Engler (PL), que foi chamado por Bolsonaro de “nosso futuro prefeito de Belo Horizonte” e marcou 31,4% das intenções de voto na mesma pesquisa. Na sequência aparecem o deputado federal Rogério Correia (PT), com 21%, e Mauro Tramonte (Republicanos), com 11,6%.

O PSD concorreu com uma “chapa pura” em 2020 e Fuad era vice-prefeito de Alexandre Kalil. Ele assumiu a prefeitura em 2022, com a renúncia de Kalil para disputar – e perder para Zema – a eleição para o governo do estado no 1º turno. Lula apoiou Kalil na eleição e se encontrou com Fuad no aeroporto, na visita à capital mineira nesta semana, mesmo que o pré-candidato do PT esteja muito melhor colocado nas pesquisas.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), recebe o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) (Foto: Ricardo Stuckert / PR)

Nordeste

A região é o bastião do PT, mas os dados da eleição de 2022 mostram que a disputa entre Lula e Bolsonaro foi bastante equilibrada nas capitais – o petista inclusive perdeu em Maceió (AL), onde o então presidente teve 57,2% dos votos. “O peso da eleição do Lula foi muito nas cidades pequenas e médias, apesar de todos os governadores do PT terem sido eleitos no Nordeste”, afirma Borenstein. “O PT passa por um desgaste, fruto dessa inflexão política à direita que o brasileiro fez – inclusive no Nordeste”.

Leia também:
Puxado por SP, Sudeste foi decisivo para vitória de Lula sobre Bolsonaro; veja desempenho por estado e região

Salvador
A capital baiana é o símbolo disso. O favorito é o atual prefeito, Bruno Reis (União Brasil), que foi vice de ACM Neto (do mesmo partido) por dois mandatos. Ele se elegeu no 1º turno em 2020, com 64,2% dos votos, e está entre os prefeitos de captais mais bem avaliados do país. Reis tem 59% de aprovação e 29% de rejeição e 52% das intenções de voto para a eleição de outubro, segundo pesquisa Atlas Intel de 31 de dezembro. “A Bahia é governada pelo PT há 5 mandatos consecutivos, mas o partido não consegue eleger o prefeito de Salvador”, destaca o analista da Arko Advice.

Lula deve apoiar a candidatura do vice-governador, Geraldo Júnior (MDB), que tem apenas 12% das intenções de voto. Apesar do cenário desfavorável ao PT em Salvador, o presidente é bem avaliado na cidade (57% de aprovação e 37% de reprovação) e a situação do bolsonarismo é pior. Em um levantamento do Paraná Pesquisas de 24 de janeiro, Reis tem 59,9%, Geraldo tem 11,2% e João Roma (PL), ex-ministro da Cidadania de Bolsonaro, apenas 6,1%. A avaliação de Borenstein é de que, nesse cenário, Lula até deve marcar presença na capital baiana, mas olhar mais para as cidades médias e pequenas do estado (onde teve 72% dos votos em 2022 e venceu em 415 dos 417 municípios).

Leia também:
Popular e carismático, ACM Neto reinventa o ‘carlismo’ e sonha com projeto nacional

ACM Neto
ACM Neto (União Brasil), ex-prefeito de Salvador (Foto: Divulgação)

Recife
No Recife (PE), a esquerda vai muito bem, obrigado. O prefeito João Campos (PSB) tem a melhor avaliação do país (81% de aprovação e 18% de reprovação, segundo a Atlas Intel) e ainda poderá ter o apoio de Lula (que nasceu em Pernambuco e é extremamente popular no estado). Pesquisa Ipespe do fim de dezembro mostra que o prefeito de apenas 30 anos tem 62% das intenções de voto. O candidato bolsonarista Gilson Machado (PL), ex-ministro do Turismo, marca apenas 3% e fica atrás de 2 nomes ligados à governadora Raquel Lyra (PSDB): Daniel Coelho (Secretário de Turismo e Lazer do estado) e Priscila Krause (vice-governadora), que são do Cidadania e marcaram, respectivamente, 5% e 4%.

Fortaleza
Na capital cearense, a disputa entre Lula e Bolsonaro será latente. O atual prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), deve concorrer à reeleição, mas sua gestão não é muito bem avaliada: ele é o 4º pior no levantamento da Atlas Intel (25% de aprovação e 45% de desaprovação). Além disso, o partido passa por um racha no estado, fruto de uma briga entre os irmãos Ciro e Cid Gomes (que saiu do PDT e voltou para o PSB). Outro ponto favorável ao ex-presidente é que o bolsonarismo tem um forte candidato no terceiro maior colégio eleitoral do Nordeste: o capitão Wagner (União Brasil), figura que ganhou notoriedade política ao liderar um motim da PM estadual em 2011 e bateu na trave em 3 das últimas 4 eleições na capital e no estado.

O ex-deputado federal Capitão Wagner (União Brasil) discursa no plenário da Câmara (Foto: Divulgação/Câmara dos Deputados)

Outras regiões

No Sul, a eleição está mais indefinida em Curitiba (PR). A candidatura do vice-prefeito Eduardo Pimentel (PSD) ainda não engrenou, apesar do apoio do prefeito Rafael Greca (PSD) e do governador Ratinho Jr. (PSD), que estão em seus segundos mandatos e têm gestões bem avaliadas pela população. Em Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC), os atuais prefeitos – Sebastião Melo (MDB) e Topázio Neto (PSD), respectivamente – são favoritos à reeleição e não deve haver surpresas. Borenstein acredita que, mesmo com o cenário já desenhado nas 3 capitais, Lula dará “uma grande atenção” às campanhas na região, “porque são capitais onde a rejeição ao Lula e ao PT são muito grandes”.

No Centro-Oeste, onde o bolsonarismo tem forte presença, o ex-presidente deve ter muita influência sobretudo em Cuiabá e Campo Grande. Mas a eleição ainda está bastante indefinida nas duas capitais e também em Goiânia (GO), sem nenhum candidato favorito até o momento. Na capital goiana, o PT tem a sua melhor situação, com a Delegada Adriana Accorsi (PT) na 2ª posição, numericamente à frente do bolsonarista Major Vitor Hugo (PL), segundo o agregador de pesquisas Ipespe Analítica. O prefeito Rogério Cruz (Republicanos) aparece apenas em 4º lugar, e o líder do levantamento é o senador Vanderlan Cardoso (PSD), que é de direita mas tem se distanciado do bolsonarismo e tentado se desvincular da imagem do ex-presidente.

Na região Norte, a principal disputa deve ocorrer em Belém (PA), onde o atual prefeito, Edmilson Rodrigues (PSOL), deve tentar a reeleição, apesar da elevada rejeição. Ele ganhou por estreita margem em 2020 – 51,8% a 48,2% do Delegado Federal Oguchi (então no Patriota, hoje no PL) – e agora está atrás nas pesquisas do candidato bolsonarista da vez, o deputado federal Delegado Eder Mauro (também do PL). Levantamento do Paraná Pesquisas de novembro mostra o parlamentar com 24% das intenções de voto, contra 16,6% de Edmilson e 9,6% de Oguchi, Além disso, pesquisa Atlas Intel de 31 de dezembro aponta o prefeito de capital com a pior avaliação do país (88% de rejeição e apenas 6% de aprovação).

Fonte: Infomoney

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*