Por Lusmar, Editoria Especial de Economia – 28 de setembro de 2025
O Brasil se aproxima de um cenário fiscal crítico que ameaça os pilares fundamentais do Estado: saúde e educação. Projeções do governo federal indicam que, a partir de 2027, o próximo mandato presidencial enfrentará um déficit de pelo menos R$ 10,9 bilhões para cumprir os pisos constitucionais mínimos de investimento nessas áreas essenciais. Essa “bomba-relógio” fiscal, como classificam especialistas, pode comprometer serviços públicos em todo o país, forçando o futuro governo a tomar decisões difíceis em um orçamento cada vez mais restrito.
O Que São os Pisos de Saúde e Educação?
Os pisos constitucionais, estabelecidos pela Constituição de 1988 e reforçados por emendas posteriores, garantem um investimento mínimo da União, estados e municípios em saúde e educação. No âmbito federal, a saúde exige 15% da receita corrente líquida (RCL) para o Sistema Único de Saúde (SUS), enquanto a educação demanda 18% da RCL para o ensino básico e 25% para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Essas regras foram criadas para proteger áreas sociais de cortes orçamentários, especialmente em momentos de crise econômica. No entanto, o crescimento acelerado das despesas obrigatórias – como salários de servidores, benefícios previdenciários e precatórios – está asfixiando o orçamento público.
As Causas do Déficit Projetado
O alerta foi emitido no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, apresentado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Congresso Nacional. As projeções mostram que o aumento dos pisos, atrelado ao crescimento da arrecadação, colide com as restrições do arcabouço fiscal aprovado em 2023, que limita o crescimento das despesas primárias à variação da receita e da inflação. Em 2027, dos R$ 122 bilhões de gastos discricionários previstos, cerca de R$ 50 bilhões já estarão comprometidos com precatórios e emendas parlamentares, deixando um espaço reduzido para cumprir os pisos de saúde e educação.
Os principais fatores que alimentam essa crise incluem:
Precatórios e emendas parlamentares: As dívidas judiciais da União (precatórios) acumularam-se ao longo dos anos, enquanto as emendas parlamentares, usadas como ferramenta de negociação política, consomem fatias crescentes do orçamento.
Crescimento das despesas obrigatórias: Benefícios previdenciários e salários do funcionalismo público representam mais de 90% das despesas totais da União, restando apenas 8% para investimentos discricionários, como construção de hospitais, escolas ou infraestrutura.
Pressões econômicas e sociais: A recuperação econômica pós-pandemia elevou a arrecadação, mas também os custos de programas sociais ampliados, como o Bolsa Família. Sem reformas estruturais, o déficit pode se prolongar até 2029, impactando serviços essenciais em todo o Brasil.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reconhece a gravidade do cenário. “Estamos navegando em um contexto desafiador, mas com diálogo e ajustes podemos evitar um colapso”, afirmou em audiência no Congresso. No entanto, com o calendário eleitoral de 2026 se aproximando, a janela para aprovar reformas está se fechando.
Impactos para o Próximo Governo
O presidente que assumir em janeiro de 2027, seja de continuidade ou oposição, herdará um orçamento “engessado”. Descumprir os pisos constitucionais seria uma violação da Constituição, passível de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF). Na prática, a falta de recursos pode levar a cortes drásticos nos serviços públicos, com impactos diretos na população:
Na Saúde: O SUS, que atende cerca de 75% dos brasileiros, pode enfrentar dificuldades para manter atendimentos eletivos, campanhas de vacinação e o controle de epidemias, como dengue e influenza. Hospitais públicos em grandes centros e regiões periféricas podem sofrer com a falta de insumos e profissionais.
Na Educação: Programas como o Novo Ensino Médio, a construção de creches e a valorização de professores correm risco de atrasos. Escolas públicas, muitas já com infraestrutura precária, podem enfrentar ainda mais dificuldades para oferecer ensino de qualidade, ampliando desigualdades educacionais.
O economista Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, alerta para o risco de um “default fiscal disfarçado”. “Sem reformas para cortar privilégios e aumentar a eficiência do gasto público, o Brasil caminha para uma crise que sacrificará os mais pobres”, afirmou em entrevista recente.
Caminhos para Evitar a Crise
O governo atual aposta em negociações com o Congresso para flexibilizar as regras de pagamento de precatórios e revisar incentivos fiscais, que poderiam liberar bilhões para os cofres públicos. Propostas como a tributação de grandes fortunas e a revisão de benefícios tributários estão em discussão, mas enfrentam resistência de setores influentes. Além disso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sugere uma revisão constitucional dos pisos, adaptando-os à realidade fiscal sem comprometer direitos fundamentais. “É necessário um pacto nacional para priorizar saúde e educação, garantindo a sustentabilidade do orçamento”, destaca um relatório do instituto.
Enquanto o debate avança em Brasília, milhões de brasileiros – de pacientes em filas do SUS a estudantes em escolas públicas – aguardam soluções. O próximo governo enfrentará não apenas uma crise fiscal, mas um teste crucial para a sustentabilidade do modelo social brasileiro. Com o tempo se esgotando, a classe política terá que escolher entre reformas estruturais ou paliativos que apenas adiarão o inevitável.
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